Maio 2011

EXPOSIÇÕES 
MAIO 2011  

Colectivo BU
“Série Totipotencial” - Técnica mista 
David Rosado 
“Aliasing” - Técnica mista 
Simona Accattatis
Desenho









Continuam


Patricia Geraldes
“O grande rio coberto de barcas mortas” - Desenho

PRÉMIO 2010 DE FOTOJORNALISMO
ESTAÇÃO IMAGEM | Mora

Martinho Costa
Da seria “VÖLKERWANDERUNG”- Pintura


PRESS-RELEASE
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Colectivo BU
“SÉRIE TOTIPOTENCIAL” - Técnica mista 


Todas as palavras se formam de outras palavras, de outras letras, de outros olhos, de outros gestos… A partir de uma criação, novas criações, novas poesias.

Totipotencial como primordial, como encaminhador, não como partida, mas como caminho. Caminhos abertos às potencialidades…

A partir de textos já cristalizados, damos-lhes uma nova vida, um novo sentido, estes novos sentidos serão também construídos pelo público, uma vez que as obras não são “fechadas”, não são rígidas. As reinterpretações dão, elas próprias, azo a novas interpretações por parte de quem as vê. Essa homenagem é feita através de reescrita, de mudança, de criação de 
múltiplos sentidos entre a obra e o contexto que a rodeia.

Nesta linha são criados os nossos trabalhos. Aproveitando-nos da plasticidade da palavra, levamo-la ao seu limite. Exploramo-la como organismo vivo que é, com o fim de encontrar todos os sentidos que lhe estão inerentes.

Assim, atribuindo toda a liberdade à palavra, esta pode disseminar-se como um vírus, perdendo a sua significação banal, primordial. Dentro da liberdade do poema/obra, estas tornam-se atemporais, espaciais.

As palavras aparecem-nos como objectos consumíveis, à mercê da gula de quem as tomar - palavras-coisas.









David Rosado 
“Aliasing” - Técnica mista 

Desde que homem teve a ousadia de delimitar o seu território com marcas submersas em superstições mágicas, nunca mais conseguiu abandonar essa vontade de querer possuir o que não é seu!

David Rosado procura no hoje, essas marcas territoriais que não se restringem a status sociais, políticos ou culturais mas que coabitam nos percursos que circunscrevem uma sociedade contemporânea.

Nesta exposição poderemos confrontar-nos com uma das afirmações de Michael Archer, quando este se debruça sobre os pós-modernismos, acreditando que “tudo já havia sido feito; o que nos restava era juntar fragmentos, combiná-los e recombiná-los de maneiras significativas”. 
Aqui o artista apresenta uma série de obras - pintura e escultura – que partem deste 
processo construtivo de recombinações, readaptações e reestruturações sobre um olhar critico e atento da cultura contemporânea.
Inês Valle






Simona Accattatis
Desenho 

Estas são as minhas personagens, adolescentes sensuais, assustados e desadaptados. Nascidos em corpos errados e mutáveis, transgender, ou melhor sem género. Melhores do que os outros prepotentes normalizados e poderosos, tão convencidos das suas próprias escolhas.
E depois os meus ratos punk, coitados! Sempre enxotados. Inertes e com um gozo especial para os olhos esbogalhados, para o susto, dessa gente bem. Esta-me a olhar porquê? Há de chegar o dia de uma revolta dos ratos, dos coitados. Espero!




Continuam









Site-specific








Patricia Geraldes
“O grande rio coberto de barcas mortas”
Inauguração Dia 29 de Abril
Projecto - ‘ O grande rio coberto de barcas mortas’

Fábrica Braço de Prata – Lisboa 2011

A ideia deste projecto surgiu quando observava as imagens do espaço a intervir, e me apercebi da imponência que o espaço contém, sendo como um grande corredor vertical. 
Imediatamente comecei a construir imagens imaginando uma serpente gigante que se ergue sobre os espectadores, envolvida por seis medalhões dourados, também eles desenhados mas desta vez com papel de veludo recortado.

Os medalhões pintados directamente nas paredes e riscados por papel de veludo que envolvem o grande desenho, apresentam-se como pequenos graffitis e atribuem um elemento de glamour à  
intervenção. A intenção é tornar um espaço de passagem num momento de pausa e de contemplação.


A intervenção consiste em 2 elementos:
1º Um grande desenho preto sobre fundo vermelho, 300 Cm x 200 cm, acrílico sobre papel colocado na parede do meio.
2º Seis círculos prateados sobre os quais seis desenhos feitos em papel de veludo, o diâmetro dos círculos é 20 cm, acrílico e papel de veludo montados nas duas paredes laterais.











PRÉMIO 2010 DE 
FOTOJORNALISMO
  ESTAÇÃO IMAGEM | Mora

O prémio, único nesta área em Portugal, promovido pela ESTAÇÃO IMAGEM com a parceria da Câmara Municipal de Mora, está aberto à participação dos fotojornalistas portugueses e dos PALOP, bem como aos estrangeiros residentes em Portugal ou nos PALOP.
A RTP e a Agência Lusa foram os parceiros media da edição 2010. O objectivo do prémio é 





promover a reportagem fotográfica, género jornalístico em que os jornais e revistas nacionais cada vez apostam menos, e o elevado número de participações confirma a importância de que se reveste uma iniciativa deste tipo. Foram submetidas a concurso 636 reportagens de 190 
fotojornalistas nesta primeira edição, resultantes de trabalhos produzidos para a imprensa em 2009.
A presidente do júri do World Press Photo 2010, Ayperi Karabuda Ecer, acedeu em vir a





Portugal para presidir ao júri do concurso. Ela é vice-presidente da Reuters Pictures, uma das mais importantes agências noticiosas mundiais. A seu lado teve o fotojornalista Francesco 
Zizola, premiado oito vezes no World Press Photo; a directora de fotografia da revista 
francesa Geo,
Magdalena Herrera e a coordenadora europeia de fotografia do jornal The New York Times, Daphné Anglès. O júri reuniu-se em Mora entre 21 e 24 de Abril, e os vencedores foram anunciados numa cerimónia pública realizada naquela vila alentejana no dia 24 de Abril. No dia 25 o júri deu uma conferência em que explicou as razões das suas escolhas.

O prémio estava dividido em sete categorias: Notícias, Vida Quotidiana, Retrato, Desporto, Artes e Espectáculo, Ambiente e Eleições. O vencedor de cada categoria recebeu 2.500 euros. De todas as reportagens a concurso, o júri escolheu a vencedora do prémio ESTAÇÃO IMAGEM | MORA, distinguida com 7500 euros. Coube também ao júri escolher, entre os 32 inscritos, qual o projecto que recebeu a bolsa ESTAÇÃO IMAGEM | MORA, no valor de 5.000 euros. O fotojornalista vencedor desenvolveu em 2010 um trabalho sobre o Alentejo, que será editado em livro e exposto na entrega dos prémios da edição 2011. Pela primeira vez em Portugal a apresentação dos trabalhos candidatos foi feita através da internet, no site da Estação Imagem.




Martinho Costa
Da séria VÖLKERWANDERUNG- Pintura

Batalhas Atópicas e Sem Memória

Integrada na nobre «Pintura de História» - o grand genre segundo a hierarquia académica formalizada no século XVII -, a cena de batalha serviu, desde a Antiguidade, de monumento comemorativo para narrar com dimensão épica as sagas militares factuais e míticas travadas pelos povos contemporâneos e ancestrais. Tal temática era tida em elevada consideração na medida em que exortava a edificação pública dos ideais civis mediante mensagens de índole moral e intelectual, invariavelmente veiculadas com um forte pendor pedagógico e propagandístico.
Na série Völkerwanderung (Deambulação dos povos), Martinho Costa parece pintar batalhas históricas. No entanto, num segundo olhar compreendemos ser vão tentar determinar o local do evento mediante uma série de presenças significativas, testemunhais. São as cenas fabricadas digitalmente, aquelas que fascinam jovens e adultos aficcionados pelo mundo das consolas e jogos para PC. E atende-se que o pintor as quis compreender depois de ter visitado os sites que as catalogam, reconhecendo que já o eram pinturas per se de pleno direito. 
Porque é que os artistas contemporâneos não pintam as grandes batalhas do presente ou do passado com a dimensão edificante de outrora? Para ensaiar respostas teremos que nos debruçar sobre as superestruturas ideológicas que determinam a nossa época: pós-colonial e anti-imperialista. O relativismo cultural desencantado, que perpassa os discursos intelectuais e políticos dominantes, visa aplacar qualquer sujeito eleito pelos conhecidos messianismos 





providenciais que inspiraram, durante séculos, os ideários heróicos das nações (ainda que alguns deles continuem espreitando, à espera de um novo ensejo). Neste pano de fundo são sucessivamente convocadas as chagas abertas pela arte oficial que marcou o período entre guerras. Mais: a própria Guerra, sob o crivo colectivo tecido após o segundo grande conflito mundial, tornara-se monstruosidade, identificada com imperialismo, ditadura e fascismo. 

Vivendo sob o fantasma do Holocausto reitera-se o paradigma da des-idealização da 





imagem do advento militar. Fenómeno já seminal no século XIX, com Goya – Os Fuzilamentos de 1808 (1816) - e exacerbado, no século XX, por Picasso - Guernica (1937) e Massacre na Coréia (1951). Nasce então o arquétipo do artista como testemunha de acusação dos horrores e absurdos da guerra, representando-a já não com a glória do fausto heróico, mas como carnificina e catástrofe. Torna-se vileza, atrocidade apocalíptica, aviso premonitório do fim da civilização. 

Contudo, nas batalhas que Martinho pinta não vemos a versão «pesadelo» do conflito 





armado visando retratar a brutalidade da barbárie e a ignomínia da degradação humana. Ainda que resolutamente desembaraçadas do sensacionalismo dramático e heróico de outrora, as suas cenas são inócuas pelo seu carácter de pura demonstração, vitrine cénica de eventos 





«fabricados» em concordância com as tipologias catalogadas na rede digital. Adquirem, ao 





invés, um sotaque escolar, de figura de manual de história ou de banda desenhada.






Martinho surge como aquele que pretende rememorar esse passado longínquo da pintura, constatando a actualização de um olhar já não ferido pela dimensão ideológica. Instaura, com isto, uma assertiva tomada de posição frente à História de Arte. Herdeira da tapeçaria 





descrita na Ilíada que conta, em curiosa situação de mise en abîme, a guerra de Tróia ( fonte mítica dos modelos protocolares da conduta heróica que perpassou milénios em consecutivas remissões eruditas ), a cena de Batalha que Martinho apropria acaba por demonstrar como os antigos esquemas recuperados pelos jogos de computador são aparentemente «instrumento neutro», fora da época que o fabricou. Lembrando que não há instrumento de uma época (ou poder), mas quando muito uma utilização histórica do instrumento. Assumindo-se, assim, como denúncia de um ingénuo, e por isso perigoso, gesto de branqueamento ideológico das formas de representação do passado.  


Estas pinturas de batalhas não oferecem modelos. Mas pintá-las significa dar-lhes, 





irremediavelmente, um peso, uma consistência maior perante a coisa vista em pequeno 
formato, que logo se desvaneceu no desenrolar do jogo, em prol da mesma coisa pintada, que permanece, ao assumir a perenidade associada ao medium. Por oposição à dinâmica cinemática do jogo, Martinho recupera o silêncio eloquente da arte monumental. Contudo, a solenidade do tema é de imediato rebaixada depois de sabermos a sua proveniência...


A indiferença ao histórico espreita para revelar a sua obstinação em seguir o destino da prestação, signo da máquina, como dispositivo de criação de realidades destinadas ao 





lazer, à aventura do imaginário actuante. De um ponto de vista céptico e desencantado, 
cínico e niilista, este empreendimento visa repensar as lógicas que subjazem a sociedade do 
entretenimento. Neste ponto, Martinho deslinda o seu dedo acusatório porque constata a 
futilidade do trânsito veloz das imagens. Tanto vale este como aquele momento, este ou aquele lugar, porque carecem de qualquer outro significado que não seja o da imagem por si mesma, 
simulacral, exaurida da sua função moral e pedagógica. (A embriaguez da amnésia aviltra 
sempre a desfundamentação do presente.) Ao usar fórmulas obsoletas que, apesar de tudo, ainda ecoam no imaginário popular mais prosaico, Martinho chega a uma irónica determinação da Pintura de História: a história não é mais facto memorável e exemplar, tampouco drama ou episódio, mas sobretudo palco de encenação/ficção incessante. A guerra que Martinho pinta já não é o evento ocorrido que se pode somente ilustrar ou recriar, mas uma virtualidade que pressupõe todos os seus possíveis desenvolvimentos e configurações, términos e resoluções, em aberto.

O sujeito-jogador ao assumir de empréstimo todas as identidades - de cavaleiro, arqueiro, chefe militar, estratega - concentra em si todas as responsabilidades e todos os actos da narrativa. Este fascínio, algo nostálgico, assenta ainda na nossa ingénita aptidão para agir na história. Neles exercita-se esse campo de batalha onde se joga a sorte, se testa a pontaria ou se tenta engendrar planos de estratégia militar. A cena «recriada» não deve mais reflectir as ambiciosas





fantasias dos soberanos, e sim responder ao deleite particular de cada um. O Homem 





contemporâneo não pode experimentar outro sentimento senão o das suas escolhas. Como que por louco acesso de soberba, pode imaginar-se assim já um qualquer general, bramindo a espada em grito de guerra, acabando de modo inconfesso por incitar as forças primárias que existem recalcadas em cada um de nós... (O visitante vê esta cegueira, encontra-se de fora, já não é jogador mas o seu juiz.)


Bruno Marques
Doutorando em História de Arte (FCSH da UNL) e membro do projecto de curadoria independente inter-face / Arte Contemporânea